floriografia

 tentei ler as flores que trazia nas mãos
mas tudo o que vi foram ramos secos
de um tempo que já passou

*

"A noite negra me deu olhos negros, mas eu os utilizo para buscar a luz"

a victor heringer 

lia sobre porcos e machados
e, como sempre sonhava com a violência
reprimida, não foi difícil identificar
naquele texto de um victor que se foi
o cinza, o cinza se repetindo nas letras
comecei o outono achando que esta seria 
a estação mais triste 
mas como poderia saber, se quase todos os dias
recolho uma folha do chão e guardo em um livro
minhas mãos em suas linhas 
[porque é preciso se colocar no poema]
nem sempre se pode falar de outras mãos 
e fugir das próprias
ouvir os porcos e erguer lâminas
nos olhos





meu submarino sou eu
minha força de sonhar sou eu também
porque quando todos vão embora
eu me tranco aqui e tudo bem

❤️

morrer apenas o estritamente necessário,
enquanto o assassino não vem

María, Fabian Bertona 


Aliança

| Julia de Carvalho Hansen |

O meu garoto não é alto
mas as suas mãos compridas
tem tal delicadeza
com que precisão
alcançam os vagalumes

do meu espírito intranquilo
entre o búfalo e a borboleta
estou precisamente neste estado
em que as larvas não arrebentam
nem as cobras trocam a pele à toa.

Vou deixando as coisas pra trás
embora seja impossível soltar
meu garoto não é bem meu
o tempo todo ele observa
o crescimento das samambaias

a mesma cordialidade com que ele observa
o inesgotável afeto dos animais domésticos
também é um mistério pra mim
a sua capacidade de só cultivar mistérios

sem códigos, quilometragem ou mesuras
meu garoto - pois eu te sei, vem
e diz assim pra mim
quero você.


floriografia

 tentei ler as flores que trazia nas mãos mas tudo o que vi foram ramos secos de um tempo que já passou *